As surpresas da mediação

Era uma sexta feira quando recebemos um casal para dar início à sessão de
 

 
mediação. Gabriela e Matheus precisavam tratar da convivência deles com a
 

 
filha Manuela, de cinco aninhos.


 
Em todas as sessões, tivemos uma surpresa: alguém da equipe precisava dar
 

 
conta de fazer companhia pra Manuela, pois os pais não tinham com quem
 

 
deixá-la.


 
Não se tratava apenas de fazer companhia para a Manuela, mas sim de
 
acolhê-la durante o período em que seus pais ficavam lá dentro durante a
 

 
mediação.


 
Foi um desafio e tanto, pois ela precisava ter confiança em uma de nós para
 

 
que pudesse ficar sem os pais.


 
Aos pouquinhos, uma integrante da equipe conseguiu conquistar Manu. Seus
 

 
olhinhos expressavam medo, angústia, tristeza e ao mesmo tempo alegria em
 

 
ver os pais juntos naquele espaço.


 
Como estava tudo certo com a Manu, começamos então a escutar o casal, e
 

 
ao longo dos relatos das histórias, identificamos que a maior dificuldade deles
 

 
era conciliar a convivência da Manu com a distância, pois seu pai, Matheus,
 

 
morava em Saquarema e Gabriela, sua mãe, em Mesquita no Rio de Janeiro.


 
Manuela já tinha experimentado morar com os dois e, atualmente, morava com
 

 
Gabriela, que estava com muitas dificuldades de conciliar os cuidados com a
 

 
filha e a profissão. Não tinha com quem deixá-la e seu trabalho era executado
 

 
na casa das clientes, pois era massagista.


 
Conversamos muito ao longo das sessões sobre os interesses e
 
necessidades de cada um e, principalmente, sobre o que seria melhor para a
 

 
Manu.


 
Como já tínhamos trabalhado as pautas objetiva e subjetiva, no momento da
 
negociação conseguiram identificar que dadas as condições de Matheus, seria
 

 
melhor para Manu ficar com ele, pois morava ao lado de uma escola, a qual
 

 
sua filha já tinha estudado e durante seu trabalho poderia contar com total
 

 
apoio de sua mãe, avó de Manu.


 
Combinaram ainda que Matheus ajudaria Gabriela com os custos de condução
 

 
para ir ver a filha sempre que pudesse, sendo-lhe garantida a convivência com
 

 
a Manu por dois finais de semana durante o mês, no mínimo.


 
Apesar de estar atuando como mediadora, por alguns segundos me passou
 

 
pela cabeça que esse acordo não seria legal para a Gabriela, pois ela ficaria
 

 
muito longe de sua filha, momento em que percebi estar usando os meus
 
valores para outras pessoas e outras relações. Rapidamente retornei ao meu

papel de mediadora e vi um lindo sorriso demonstrando muita satisfação no
 

 
rosto de Gabriela.

Imagem por empow.me

Como mediadora, preciso entender o que é essencialmente importante para
 

 
cada parte dentro dos seus históricos de vida, compreender as dinâmicas
 

 
das relações e estar totalmente comprometida, estritamente, com as falas dos
 

 
mediandos, aquilo que eles estão trazendo.

É uma árdua tarefa conseguirmos nos desconectar das nossas visões de
 

 
mundo, e passar a estarmos conectados ao que realmente faz sentido para as
 

 
partes dentro de suas perspectivas e experiências.


 
Conto isso para demonstrar como é essencial no momento em que estamos
 

 
atuando como mediador, nos despirmos de nossos juízos de valor, afinal, o
 

 
que é o ideal para mim, pode não ser para o outro.


 
Deixo aqui um gostinho de quero mais, pois a tão famosa imparcialidade do
 

 
mediador trarei no próximo artigo.