Mediação: transitando entre a delicadeza e as habilidades

Recentemente tivemos uma mediação de um ex-casal que somava quase duas dezenas de processos entre administrativos e judiciais. Quando realizamos os contatos iniciais com um e com o outro, ambos demonstraram resistência a participar de encontros presenciais conjuntos. Considerando a situação, oferecemos, além da alternativa de iniciarmos com ambos, em uma reunião conjunta, a possibilidade de conversarmos com cada um deles em separado.

Cuidamos de expressar a nossa expectativa de que essa decisão fosse alcançada a partir de um consenso e referimos a intenção de que eles pudessem, quando julgassem oportuno, participar de encontros conjuntos para que o diálogo entre eles pudesse ser restabelecido.

Buscamos uma decisão pautada em um consenso e foi possível estabelecer o consenso entre todos, mediandos e equipe. Em construção conjunta, foi estabelecido um cronograma para a realização das duas reuniões iniciais e em separado, assim, cada um ao seu tempo teria a oportunidade de expressar as suas inquietações, medos e desconfortos.

Durante as reuniões, as falas traziam mágoas profundas por ausências que se faziam presentes todo o tempo e eram doídas. Os silêncios eram retumbantes e perturbadores inviabilizando uma comunicação efetiva.

Parece, entretanto, que essa decisão pautada em consenso foi catalizadora de novos olhares e possibilidades. Eles contaram que, em cerca de quatro anos, aquela era a primeira decisão estabelecida a partir do diálogo e de reflexões visando ao bem-estar de ambos. Eles estavam surpresos e assumiam que, para eles, o consenso não era uma possibilidade.

Em reunião conjunta, todos experimentamos algumas surpresas: ao chegarem, sentaram-se lado a lado, deixando espaço para a equipe se acomodar ao redor do restante da mesa em formato circular; na sequência, falaram com delicadeza, nitidamente cuidando das palavras; estabeleceram uma conversa direta, franca e respeitosa em que as convergências passaram a prevalecer às divergências e as acusações deram lugar a uma escuta profunda.

Nós nos sentíamos, enquanto equipe, saindo da cena conforme a reunião ia avançando. Era como se as nossas luzes fossem sendo apagadas, tornando-nos invisíveis, ao mesmo tempo em que as deles iam iluminando-os mais e mais. Apenas acompanhávamos o diálogo. Conforme falavam, cada escolha ia sendo revelada e a vida ia sendo desvelada. Os fios desatados iam sendo conectados, organizados, entrelaçados e tudo parecia ganhar um novo sentido.

Em dado momento, dirigindo-se à equipe, disseram que a incapacidade de dialogar os levara a muitos processos, mas agora, que haviam recuperado ou construído essa capacidade de comunicação, de falar e de ser ouvido, a mediação já não fazia mais sentido. Não desejavam prosseguir. Nós sabíamos que eles não precisavam mais dela.

Esse caso reforça em mim o delicado papel do mediador, a sua arte de construir pontes e portas; seu ofício de transitar entre a sensibilidade e as habilidades, cuidando para que as pessoas possam ser e se sentirem tão livres ao chegarem, quanto ao saírem de uma mediação.