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"Conhece-te a ti mesmo"

Quando adentramos no mundo da construção do consenso pelo diálogo, auxiliando pessoas a encontrarem soluções adequadas a seus conflitos de forma colaborativa, aprendemos muitas ferramentas e técnicas de comunicação e de negociação. Resumo com conotação positiva, escuta ativa, estímulo à empatia, formulação de perguntas auto implicativas, identificação da pauta subjetiva, separação das pessoas dos problemas, são alguns exemplos de recursos contidos na imensa caixa de ferramentas[1] que usamos. Cada vez mais nos aprofundamos nas técnicas para as utilizarmos de forma habilidosa quando chamados a auxiliar pessoas a resolverem seus conflitos por meio do diálogo. Chegamos a dizer que ensinamos pessoas a resolverem seus problemas por si mesmas. Por isso, muitos consideram a mediação um processo pedagógico.


Somos extremamente habilidosos na utilização das ferramentas quando mediamos conflitos, porém, não raras as vezes, não somos tão bons assim quando precisamos lidar com nossos próprios problemas. Pode parecer algo contraditório e que coloca nossa expertise sob suspeita. Mas isso acontece porque estamos auto implicados nas nossas próprias questões, presos nas nossas posições. Não ouvimos direito, não nos comunicamos adequadamente, temos dificuldades de nos colocar no lugar do outro. Às vezes, o mediador precisará de um mediador. E qual o problema disso? O psicólogo precisa de terapia. O advogado não gosta de atuar em causa própria. O médico nem sempre se auto medica...


O conhecimento das ferramentas de comunicação e negociação não nos livra dos conflitos, é verdade, mas pode nos auxiliar a identificarmos nossas dificuldades com mais facilidade. E uma das nossas dificuldades é constatar que o oponente mais poderoso em um conflito somos nós mesmos. É comum nos sabotarmos, nos criticarmos, nos culparmos. Não nos olhamos com empatia. Mas o olhar cuidadoso que lançamos sobre os outros deve primeiramente ser lançado sobre nós mesmos para entendermos o que queremos, o que desejamos e o que motiva as nossas posições. É preciso, assim, inicialmente, que nos conheçamos profundamente. Somente conseguiremos atender as necessidades dos outros, se conhecermos primeiramente as nossas. “Conhece-te a ti mesmo”, já nos avisava a sabedoria grega há milênios.


Muitos conflitos surgem porque queremos satisfazer os outros mas desconhecemos nossas próprias necessidades ou temos pouca clareza sobre elas. Sobre o tema, William Ury publicou o livro “Como chegar ao sim com você mesmo” (Editora Sextante). Ele afirma que o maior obstáculo a acordos bem-sucedidos e relacionamentos satisfatórios não é a outra parte, por mais difícil que ela possa ser. Na verdade, o principal entrave somos nós mesmos.


Aprendemos a lidar com o outro, a ouvir o outro, a nos colocarmos no lugar do outro. Ensinamos outras pessoas a fazerem assim também. Mas esquecemos da pessoa mais importante nesse processo. Se olharmos no espelho, nós a veremos

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[1] Sobre a caixa de ferramentas, leiam ALMEIDA, Tania. Caixa de Ferramentas em mediação: Aportes práticos e teóricos. São Paulo: Dash Editora, 2014.

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© 2017 por Ana Kucera

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