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“Ganhando o pão em família”


Quando comecei a pensar sobre qual seria o tema do artigo de hoje, deparei-me com uma dúvida cruel, se falaria sobre minhas experiências com as mediações familiares ou com as empresariais.

Dúvida essa que se justifica, pelo fato de que há uma década transito em ambos os universos como mediadora e, em alguns momentos, eles se fundem. Isso porque, segundo as pesquisas da PWC, 85% das empresas brasileiras são familiares, variando entre grandes, médias e pequenas.

Eis que de repente em 2019, enfrentei meu maior desafio de minha carreira, que será o tema de nosso artigo: meu próprio negócio em meio a uma crise de família-empresarial.

Sou advogada empresarial especializada na área trabalhista, capacitada como mediadora privada e sênior judicial e, para completar, sou proprietária de um pequeno restaurante no Centro do Rio de Janeiro, dentro de um belo prédio histórico.

O restaurante foi fundado há uma década, negócio de família, marido gerindo, eu sendo consultora externa, minha mãe na posição de gerente operacional e minha irmã na posição de gerente financeiro, ingredientes fartos para um bom conflito.

Com o passar do tempo algumas alterações ocorreram, como a saída da minha mãe, o conflito de ideias com o então marido à época, o meu divórcio no ano passado e a minha volta à plena gestão no início desse ano de 2019.

Em meu retorno, reintroduzo minha mãe, profissional reconhecida pelo mercado e pela clientela há mais de 25 anos no ramo de restaurantes para me ajudar a reorganizar a casa, pois seu Know-how era imprescindível nesse momento, até porque, se sei o que sei, devo aos ensinamentos de Dona Chan.

Novos tempos, nova gestão, novo olhar, empresa passando por dificuldades financeiras, estruturais e necessitando ser profissionalizada: desafios de tirar o sono!

Contudo, o maior desafio se deu ao longo do caminho, ser mediadora não significaria que eu conseguiria dar conta de resolver tudo, afinal “santo de casa não faz milagre”, em meio ao caos total, ainda surge uma crise de pontos de vista entre as gerências, fato que viria ainda a afetar as relações familiares.

Só consegui pensar em um caminho: alguém que pudesse olhar do alto o nosso problema e que pudesse nos ajudar a encontrar soluções que beneficiassem o negócio, do qual 15 famílias dependiam para viver. Eis que veio a ideia da Mediação. Mas como eu, mediadora, iria me submeter a um procedimento de mediação? Quem seria o mediador, pois conheço quase todos no Rio de janeiro? Como sugerir a minha família esse procedimento, uma vez que como mediadora não consegui eu mesma resolver os meus conflitos?

Pensei um pouco sobre o assunto e primeiramente entendi que por ser parte do conflito não estava o suficientemente distante para ir ao balcão olhar o problema e separar o problema das pessoas, estava tudo junto e misturado, anos de convivência, choque de gerações, hierarquia desmistificada, sobrevivência em pauta, necessidades e interesses de um ser humano/mulher e não de uma mediadora profissional.

Foi então que me lembrei de uma parceira mediadora que havia me mostrado o seu projeto de facilitação de diálogos e mediação no segmento de restaurantes (CUCA) e que obtivera sucesso, fiz contato imediatamente e lhe perguntei se seria possível mediar a minha equipe da empresa.

Para minha surpresa, foi possível e para minha tranquilidade também, pois sabia que era uma profissional com quem eu poderia me sentir segura. Estava, afinal, tratando do meu negócio que hoje sustenta as minhas duas filhas também.

Após terem conhecimento de que a mediadora seria minha conhecida, ambas as gerentes, minha mãe e irmã, gostaram da escolha da profissional por também se sentirem seguras com ela. Feito os convites, iniciou-se o procedimento de mediação com reuniões privadas e conjuntas no escritório da mediadora.

Após uma série de rodadas houve uma mudança na dinâmica para melhor e surpreendentemente, ocorreu uma conscientização de que o caminho que estávamos focando como sendo o desejado, não era o ideal para o negócio.

Logo, tivemos que entender que “ganhar o pão em família” era o nosso desejo, mas não era o ideal nesse momento de transição, e por si só a peça chave do nosso tabuleiro se retirou para uma posição prospectiva de consultora externa do restaurante.

Desta forma, a equipe como um todo se sentiu mais tranquila por poder perceber que a harmonia foi restaurada e a relação familiar foi preservada.

Resumindo, a mediação vivida por mim enquanto mediadora me proporcionou vivenciar o desafio na pele de ter o cuidado com as relações pessoais, a busca pelos interesses comuns ao máximo de sua potência e a importância da construção em conjunto, visando uma solução que seja benéfica para o todo, mesmo que tenhamos que abrir mão de algo e que crise é oportunidade sempre de mudança.

Citando o velho sábio Sun Tzu: “As oportunidades multiplicam-se à medida que são agarradas”.

*Graduada em Direito, Certificação de Educação Continuada em Direito Empresarial Trabalhista-FGV. Formação Mediare em Mediação de Conflitos, Capacitada como mediadora judicial pelo TJ/RJ, Certificada como mediadora pelo ICFML, capacitação em Práticas Colaborativas pelo IBPC, capacitação em Franchising pela ABF/SP. Mediadora do Mediare, Coordenadora da Câmara AEB de Mediação de Conflito e da Câmara de Mediação de Conflitos OAB-RJ , Mediadora do TED e da CaMC da OAB-RJ, Mediadora Sênior Judicial do TJ/RJ, Mediadora da CamAEB, CBMA C.A.S.A., PAX e Mediadora da Câmara de Mediação e Arbitragem da FGV. Sócia-proprietária do restaurante Arlequim e da Consenso Mediação de Conflitos.

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